História de Juara
A partir do governo do Presidente Getúlio Vargas (1930-1945) a colonização da Amazônia passou a ser vista como um dos caminhos possíveis para o desenvolvimento e defesa do território brasileiro. Impulsionado pelo segundo ciclo da borracha e pela preocupação da manutenção e defesa das fronteiras, esse período ficou conhecido como a Marcha para o Oeste.
Em 1966, o então presidente Castelo Branco, faz o famoso discurso pela unificação do país, falando da ocupação da Amazônia e da necessidade de “integrar para não entregar”.
Os projetos de colonização da Amazônia através da fundação de cidades por empresas privadas, as colonizadoras, também foram estratégias políticas utilizadas pelo Governo Federal para promover a ocupação e exploração da região amazônica.
Esses processos de ocupações da Amazônia não foram naturais. Além das políticas governamentais, envolveram, sobretudo, a coragem e ousadia das muitas famílias envolvidas, de agricultores em busca de uma terra promissora e trabalhadores em busca de novas oportunidades.
“Quando aqui chegamos, a gleba era um mundo verde, dormindo na solidão da Amazônia. Transformamos o seu rosto, abrindo clareiras e picadas na mata virgem e enfeitamos de roças as novas terras. Depois, devagarzinho, vieram outras famílias, e umas vindo e outras indo embora, pois, não acostumavam com o clima ou se assustaram com a mata. E no começo foi muito difícil por esta razão. Muitas vezes vinha uma mudança e no mesmo caminhão voltava outra. Mas nós aguentamos firmes e sempre com a esperança e vendo que a cidade iria muito crescer (José Antonio de Oliveira, 2008 APUD Sant’Ana, 2009, p. 92).
“Através da propaganda me convenci de que era para lá que eu conseguiria uma produção para sustentar meus filhos, era promessa de terra boa e mais barata, ainda pouco conhecida […]” (José Carlos Santos, 2007 APUD Sant’Ana, 2009, p. 95).
Quando os primeiros homens brancos se instalaram no território do atual município de Juara, os povos indígenas Kayabis dominavam a região, que era muito disputada por povos de outras nações indígenas. Os conflitos entre as diferentes etnias eram constantes, motivados pelo controle de territórios e pela abundância, na região, de taquara e pedra sílex, matérias primas para fabricação de flechas, lanças, machados e outras ferramentas dos afazeres domésticos e de fins bélicos (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 6).
Segundo os colonizadores, algumas etnias eram mais pacíficas do que outras, como os Kayabis, por exemplo. “Os índios da região nunca tiveram conflito com a sociedade. Havia alguns índios, algumas aldeias, que tiveram conflitos com fazendeiros próximos, fora das terras da SIBAL. Eram os Canoeiros. Os Kayabis nunca tiveram problema com ninguém” (Dirceu Oliveira dos Santos, 2008 APUD Sant’Ana, 2009, p. 139).
“O fato é que (…) os índios procuraram manter-se afastados do local, e alguns outros já se colocaram como mão-de-obra para trabalhar para os agricultores na derrubada da mata. A colonização de Porto dos Gaúchos acabou propiciando à colonizadora SIBAL um caminho mais ‘livre’ junto aos indígenas” (José Tomaz da Silva, 2007 APUD Sant’Ana, 2009, p. 104).
O início da colonização de Juara teve como referência a já estabelecida cidade de Porto dos Gaúchos. No dia 23 de setembro de1971, a empresa SIBAL, adquiriu uma área de mais de 35.000 hectares de terras, cuidadosamente selecionada com fins de colonização aqui na região e rapidamente conseguiu vender os lotes divididos desta aquisição. Segundo José Olavo Giraldes Gonçalves “o Banco do Brasil lançou um financiamento para o pequeno agricultor, a compra de lotes de terra com o prazo de 10 anos. Nestas condições nós precisávamos de uma grande área, […] e encontramos na proximidade de Porto dos Gaúchos. Compramos uma área de 35.000 ha, eu, José Olavo Gonçalves, o José Pedro Dias e o Antônio Pereira Braga, foi criado uma empresa com o nome “SIBAL” – Sociedade Imobiliária da Bacia Amazônica Ltda. Aí demos entrada no INCRA e depois no Banco do Brasil, que aprovaram depois de certa luta, que é normal pelo tamanho do negócio. Uma vez aprovado as vendas foram mais fáceis, pois vendemos quase toda a área no período de um ano” (Sant’Ana, 2009, p. 96).
A responsabilidade da administração para a construção da infraestrutura ficou a cargo do Colonizador José Pedro Dias (Conhecido como Zé Paraná) por ser morador e conhecedor da região do Vale do Arinos desde o ano de 1957 e em 8 de outubro de 1971, partiu, com um grupo de pessoas, das margens do Ribeirão Caracol, chegando ao Córrego de Água Boa, ponto inicial da colonização da nova cidade.
“Zé Paraná” ficou sendo o responsável por preparar a área, com a abertura de estrada e demarcação das terras, iniciando o processo de venda dos lotes, 180 lotes divididos em 50 hectares. Em 1972, construíram-se barracões e uma infraestrutura considerada básica, para receber as primeiras famílias. Chegaram assim, em 1973, através do trabalho de corretores e da propaganda financiada pela colonizadora, as 40 primeiras famílias, que vieram com o objetivo de trabalhar na agricultura, cultivando arroz, milho e café. Nos anos posteriores da década de 70, a Gleba Taquaral, primeiro nome dado a área que estava sendo “colonizada”, recebeu um fluxo grande de agricultores, vindos, sobretudo do Sul do país, e muitos trabalhadores, principalmente do Nordeste” (Sant’Ana, 2009, p. 108).
No dia 08 de julho de 1973, foi colocado o primeiro marco da sede e as famílias ali já plantando arroz, milho e feijão. A primeira produção da região foi guardada em um barracão de madeira de 300 metros quadrados. Como os plantadores não tinham meios de transporte para levar a produção para fora da região, a empresa colonizadora SIBAL acabou comprando toda a safra colhida naquele ano. Era uma maneira de minimizar os problemas enfrentados com o escoamento do produto colhido na lavoura. Nessa época, em período de chuvas, as viagens eram feitas pelo Rio Arinos, sendo que os produtos comestíveis e farmacêuticos vinham de Cuiabá. No período da seca a viagem era feita por um caminho diferente do atual. O antigo traçado desviava do atual município de Tapurah e passava pela célebre “Estrada da Baiana”, na estrada da mata. Esta rodovia, conhecida por estrada da Baiana, encurtaria, mais tarde, a distância entre as cidades de Juara e a capital, Cuiabá (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 7).
A primeira serraria da região foi montada pela colonizadora SIBAL e depois comprada pelo Sr. Albino Gugelmin, que em 1973 serrava as madeiras para a construção das primeiras casas na cidade. O nome dessa serraria era Timber da Amazônia e o gerente era o Sr. Augusto Palamar, que morava na própria serraria com sua família.
Neste mesmo ano, montou-se o primeiro armazém atacadista da região de propriedade da Família Canton e foi celebrada a primeira missa na Gleba Taquaral, no meio da selva, onde a luz provinha de velas acesas em cima de árvores, e em setembro construída a primeira capela, tendo São José por orago (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 7).
A primeira pista de pouso de avião passou a ser, mais tarde, uma das avenidas da cidade de Juara (onde hoje é a Avenida Jose Alves Bezerra). Os aviões taxiavam na Praça do Redondo, hoje denominada de Praça dos Colonizadores. O aeroporto municipal, com maior capacidade de pouso e decolagem foi construído posteriormente, porém a pista de pouso era de terra.
Ainda no ano de 1973, foram plantadas 2.500 mudas de café na comunidade do Pé de Galinha. O sucesso da Gleba Taquaral e redondezas, atraiu muita gente, principalmente agricultores e suas famílias e em 1974 venderam-se 102 lotes na zona rural do rio dos Peixes. Foi um crescimento explosivo e um fluxo migratório intenso (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 7).
Foi nesse contexto que a então Gleba Taquaral passou a chamar-se Juara. Há certa controvérsia em relação ao topônimo Juara. Uma das versões é de que sua origem vem da língua tupi, significando “Moça Bonita”, sendo a mais aceita. A outra versão é atribuída ao antigo diretor da SIBAL, Sr. José Olavo Giraldes Gonçalves, que teria juntado as palavras Juruena e Arinos, numa referência geográfica à região, formando a palavra “Juarinos”, mais tarde simplificado para Juara (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 6).
Uma deficiência bastante lembrada nos relatos dos pioneiros era a assistência médica. Nos primeiros anos, anos após a instalação das primeiras 40 famílias em Juara, o mais próximo para socorrer os doentes era o médico de Porto dos Gaúchos. Quando os doentes se encontravam em situações mais graves era preciso solicitar ajuda da capital para auxiliar na transferência do doente (Sant’Ana, 2009, p. 111).
“Tinha muita morte. Meu irmão faleceu com 21 anos e ninguém sabe do quê. Não tinha médico, não tinha estrada, meu marido pediu para um rapaz ir de barco em uma fazenda, que levava um dia para chegar à fazenda, para passar um rádio para vir um avião. Quando o avião chegou fazia dois dias que tinham enterrado ele” (Dirce Bezerra, 2008, APUD Sant’Ana, 2009, p. 112).
Em 1976, Juara recebeu o primeiro médico, Dr. Isaías Pinheiro Antunes, que construiu um grande hospital e maternidade, um ato pioneiro para a época e para a região. Mas as dificuldades com assistência médica não acabaram por aí, a logística e as estradas precárias dificultavam o transporte de pacientes, de equipamentos e medicamentos.
“O hospital com rede, e o Isaías operando com vela, pois não tinha luz, não tinha nada, eu não dormi de noite, e ele ficou apavorado comigo ali, ele não sabia que eu vinha […] Eu não dormi, tinha um babando pra cá e outro gemendo pra lá, não tinha quarto separado, não tinha nada. […] tudo era negociando com o governo, vinha da capital, demorava a chegar, não tinha nada, o hospital era todo mundo junto, doentes de vários tipos ficavam juntos (Alvorina Machado Antunes, 2007, APUD Sant’Ana, 2009, p. 112).
“[…] não havia remédio, […] se um ficava doente curava com remédio caseiro ou morria” (C. J. L, 2008, APUD Sant’Ana, 2009, p. 112).
Quando os entrevistados falam do início de grandes dificuldades e sacrifícios muitas vezes eles narram os acontecimentos com orgulho e saudosismo, a coragem e bravura do desbravador que enfrenta adversidades pela união de todos os que para essas terras migravam ao clima de esperança e do otimismo (Sant’Ana, 2009, p. 112-113).
“[…] Na época eu me lembro que todo mundo conhecia todo mundo, existia uma união muito grande entre as pessoas que moravam aqui. As pessoas que chegavam eram recepcionadas pelas que já moravam aqui, essas pessoas procuravam as que chegavam e faziam amizades, pois eu acho que todos os que estavam aqui estavam com o mesmo objetivo, todos tinham deixado suas terras, deixado seus familiares, estavam nesse lugar distante, então aquilo fazia com que se criasse um elo de amizade, cumplicidade entre as pessoas. Existia assim uma união muito grande entre todos (Cleuza Regina Balan Taborda, 2008, APUD Sant’Ana, 2009, p. 113).
“[…] era uma união tão maravilhosa que o que cada um podia fazer para ajudar fazia, um ia dando a mão para o outro […] (Nilza da Rocha Carmo Dias, 2007 APUD Sant’Ana, 2009, p. 113).
No mês de março deste mesmo ano foi criada a primeira Escola Estadual de 1º Grau de Juara e funcionava nos espaços dos barracões onde se armazenava a produção agrícola daquela época (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 7).
Até então denominado de gleba, em 4 de julho de 1976 foi criado o distrito de Juara, com território jurisdicionado ao município de Porto dos Gaúchos.
Em 1978, repartem-se a quantidade de 85 lotes de terrenos na comunidade de Mundo Novo, e a quantidade de 118 lotes na comunidade de Águas Claras. Duzentas pessoas adquiriram lotes pequenos, não superiores a 121 hectares na comunidade de Jaú. A movimentação da comunidade foi para o município de São José do Rio Claro, com abertura de 130 lotes de terra na comunidade de Catuaí. Porém, pela distância demasiada da sede municipal de São José do Rio Claro, Juara dominou a região ao norte daquela cidade (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 8).
No ano de 1979, foi inaugurado um prédio escolar de alvenaria, com seis salas de aula, com capacidade de abrigar 700 alunos e recebeu o nome de Escola Estadual de 1 e 2 Graus Juara, que mais tarde alterou a nomenclatura para Escola Estadual de 1 e 2 Graus Oscar Soares.
No ano de 1980, a grande produção de café fazia famosa o nome de Juara para o Estado de Mato Grosso e para o Brasil (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 8), porém, gradativamente, a “terra dos enormes pés de café” tornou-se a “capital do Gado”.
Um processo de plebiscito foi aberto em 11 de maio de 1981, para se saber a vontade do povo a respeito da emancipação política de Juara. Dos 729 eleitores, apenas 03 votos foram nulos e 05 em branco, sendo os demais “sim” para a emancipação política do município (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 8).
Assim, a emancipação política chega em 23 de setembro de 1981, onde “Fica criado o município de Juara, com sede na localidade do mesmo nome, cuja área é desmembrada do município de Porto dos Gaúchos” (Lei Estadual nº 4349/1981, artigo 1º).
O artigo 3º desta mesma lei impedia a eleição municipal de forma imediata, e o colonizador José Pedro Dias, conhecido como Zé Paraná, foi nomeado em 14 de dezembro de 1981, pelo então Governador do Estado de Mato Grosso, como o primeiro prefeito do município de Juara. No entanto, as movimentações eleitorais para escolha do prefeito e vereadores não demoraram a acontecer e a primeira eleição direta pelo voto da população juarense ocorreu em 15 de novembro de 1982, onde José Geraldo Riva, também de família pioneira no município, foi eleito prefeito (Gabinete de Gestão Integrada, Governo de Mato Grosso, 2011, p. 8).
Finalmente, em 4 de julho de 1985, Juara foi designada como comarca.
Abrigando os distritos de Águas Claras, Catuaí e Paranorte, a área atual do município de Juara é de 22.632,713 km², o que o coloca na posição 6 de 141 entre os municípios do Estado (IBGE, 2022).
GALERIA DE GESTÕES DOS
PREFEITOS DE JUARA-MT
JOSÉ PEDRO DIAS
(INDICADO PELO GOVERNADOR DO ESTADO)
JOSÉ GERALDO RIVA
(PRIMEIRO PREFEITO ELEITO PELO VOTO DIRETO)
JOSÉ PEDRO DIAS
APARECIDO PINOTTI
PRIMINHO ANTONIO RIVA
PRIMINHO ANTONIO RIVA
OSCAR MARTINS BEZERRA
OSCAR MARTINS BEZERRA
JOSÉ ALCIR PAULINO
LOURIVAL DE SOUZA ROCHA
PREFEITO INTERINO
EDSON MIGUEL PIOVEZAN
LUCIANE BORBA AZOIA BEZERRA
CARLOS AMADEU SIRENA
CARLOS AMADEU SIRENA
CONFIRA ABAIXO
REFERÊNCIAS
Sant’Ana, Daniela Alves Braga. Dissertação de mestrado. Alianças multifacetadas: colonização de Juara – Mato Grosso – discursos, práticas culturais e memórias (1971-2008). UFMT, 2009.
Lei Ordinária 4349/1981. Disponível em https://www.al.mt.gov.br/norma-juridica/urn:lex:br;mato.grosso:estadual:lei.ordinaria:1981-09-23;4349, acesso em 19/05/2023.
Histórico de Juara. Disponível em https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mt/juara/historico, acesso em 10/05/2023.
Panorama de Juara. Disponível em https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mt/juara/panorama, acesso em 13/05/2023.
História de Juara. Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Juara, acesso em 10/05/2023.
História de Juara. Disponível em https://www.facebook.com/ahistoriadejuara, acesso em 14/5/2023.
Levantamento geopolítico, socioeconômico, e cultural da microrregião de Juara. Gabinete de Gestão Integrada. Governo de Mato Grosso, Disponível em https://www.sesp.mt.gov.br/documents/4713378/12074254/Texto+GGIM+-+Juara.pdf/8029198f-8313-4d85-85a0-38aa134af586, acesso em 11/05/2023.